Nunca se discutiu tanto gênero. O feminismo e as definições de masculino e feminino são debatidos em toda parte: revistas, blogs, séries, filmes, palestras, programas de TV etc.
E a sensação que temos é que, mesmo com tanta informação disponível sobre o assunto, continuamos vendo marcas e empresas se posicionando de forma conservadora — e clichê — ao divulgar produtos e serviços para o público feminino.
Mas por que as marcas continuam errando tanto? Porque todo ano, no dia 8 de março, vemos casos da publicidade errando (e feio) na comunicação com as mulheres?
Afinal: em 2017, como podemos fazer marketing para mulheres?
Porque o marketing para mulheres deve ser mais bem pensado
A mulher brasileira não sente que a publicidade a representa. Em pesquisa realizada pelo SPC Brasil, 58,5% das mulheres afirmaram que a propaganda não retrata a mulher real.
Os motivos variam:
- Quase 60% das entrevistadas acreditam que as mulheres retratadas na publicidade são muito diferentes fisicamente da realidade;
- 32% citaram que se sentem incomodadas com a objetificação e sexualização das mulheres na propaganda;
- 30% não gostam da imagem da mulher perfeita que é construída pelas marcas.
E não pára por aí.
Esse problema se agravou tanto que as mulheres não se sentem mais impactadas pela publicidade.
Segundo pesquisa realizada pelo Think Eva, para 62,4% das entrevistadas a publicidade desperta o sentimento de “mesmice”. 55,7% não conseguiram se lembrar de propagandas que chamaram sua atenção.
Os segmentos de moda, beleza, automóveis e cervejas são os mais citados como problemáticos na pesquisa do SPC.
49,2% dessas mulheres querem ver mulheres guerreiras na publicidade. 46,6% querem mulheres retratadas sem o padrão de beleza inatingível do cinema e da TV.
Elas querem ver mulheres dinâmicas. Ao perguntar quais características elas querem em mulheres na publicidade, o Think Eva descobriu que 85,8% das entrevistadas querem ver mulheres inteligentes e 72,3% querem ver mulheres independentes retratadas.
Se esses dados ainda não conseguiram convencer você, saiba que 73,2% das mulheres na mesma pesquisa afirmam ter interesse por tecnologia, mas sentem que as empresas se dirigem apenas ao público masculino em suas mídias.
Isso não é apenas uma questão de se adequar aos novos tempos ou ser politicamente correto — ao errar a mão ao fazer marketing para mulheres você também está perdendo um público valioso com alto poder de consumo.
4 dicas práticas do que fazer (e o que não fazer de jeito nenhum) no marketing para mulheres
Ok, até aqui você já deve ter entendido que a comunicação para as mulheres precisa ser bem feita. Elas são consumidoras comuns e querem uma publicidade digna de seu dinheiro.
Mas se você não sabe bem por onde começar, aqui vão 4 dicas práticas:
1. Pare de ver as mulheres como um nicho
As mulheres não são um nicho específico de mercado.
Elas são mais da metade da população brasileira e, adivinhem só: elas também compram cervejas, carros, produtos tecnológicos… e se seu produto é mais voltado para mulheres (como produtos de higiene feminina, cosméticos, moda feminina, etc) é um grande erro apostar que elas são todas iguais e pensam ou se comportam da mesma maneira.
Vivemos falando por aqui da importância de se construir personas voltadas para o seu negócio. E com as mulheres é a mesma coisa. Se você está vendendo maquiagem, por exemplo, a sua persona não pode ser apenas “mulheres de 25 anos que compram maquiagem”.
Ela precisa ser específica e realmente destrinchar os gostos e hábitos da pessoa que vai consumir de você.
Quer exemplos legais?
A Avon reverteu a ideia de que maquiagens são produtos apenas para mulheres. Além de conversarem com um público muito mais moderno, eles mostraram seu apoio a diversas causas e, vamos ser sinceros: fizeram um vídeo superdivertido!
A Quem Disse Berenice é outro exemplo muito bacana de como conversar com o público feminino de forma verdadeira, natural, moderna. Nada de conversar com uma mulher que não existe!
E se você achava que só teria exemplos de produtos de beleza, pense de novo. A campanha This Girl Can da The National Lotery mostra como mulheres reais fazem exercício: suando, balançando, ou seja, nada como aquelas mulheres perfeitas e artificiais dos bancos de imagem.
2. Nada de objetificação
Eu sei que você pode ter sido ensinado que sexo vende. E que mulheres nuas ou semi-nuas são uma ótima maneira de chamar a atenção.
Mas sexo NÃO VENDE.
A Universidade de Ohio derrubou esse mito da publicidade em 2015, mostrando que conteúdos com alta carga sexual ou violenta podem até chamar a atenção do consumidor, mas de forma negativa.
Se objetificar mulheres não vai aumentar as suas vendas, vai contribuir para uma cultura opressora e ainda ofender uma grande parcela do seu público, fica a pergunta: por que ainda insistir nisso?
3. Estereotipar mulheres é coisa do século passado
Nem toda mulher odeia esportes, nem toda mulher quer casar e ser mãe, nem toda mulher gosta de maquiagem ou moda. “Nem toda mulher” são palavras importantes quando falamos de publicidade.
Nunca assuma que todas mulheres são iguais ou possuem o mesmo gosto. O papel da mulher mudou há muito tempo e estereotipar esse público é um grande erro de qualquer marca. Quer ver um exemplo disso na prática?
A marca de cervejas Proibida achou que seria um boa ideia criar uma cerveja para mulheres que é delicada, doce e perfumada. Não precisamos nem falar que isso foi um tiro no pé, não é mesmo?
Esse produto afastou as mulheres cervejeiras que já eram consumidoras da marca e gerou um péssimo buzz negativo nas redes sociais da empresa. Afinal, quem disse que todas as mulheres gostam de coisas delicadas?
A marca de bebidas Catuaba Selvagem conseguiu se aproveitar muito bem do buzz negativo a seu favor. Eles fizeram uma campanha deixando bem claro que “goró de mulher é o que ela quiser”:
Geralmente, produtos com versões para mulheres são uma ideia ruim. Se eles oferecem exatamente a mesma coisa e o que muda é o nome e a embalagem, qual é seu verdadeiro propósito? Eles também podem gerar algo conhecido como pink tax (ou imposto rosa), que vamos explicar a seguir.
Entendendo o pink tax
Você já ouviu falar em pink tax?
O pink tax acontece quando produtos feitos especialmente para “mulheres” custam mais caro que os produtos direcionados ao público masculino.
E não estamos falando de diferenças na produção ou composição desses produtos. Normalmente, eles se diferem apenas na embalagem — o das mulheres é rosa e custa cerca de 7% a mais do que os outros produtos.
Será que eu realmente preciso de uma caneta feita especialmente para mulheres? Em 2014 a Bic criou a linha de canetas “For her” e a comediante Ellen Degeneres fez um vídeo ironizando a situação — finalmente uma caneta feita apenas para nós, mulheres!
Considerando que as mulheres, em média, recebem salários menores que os homens, é até revoltante pensar que um produto custa a mais só porque ele recebeu a cor rosa e decidiram que ele foi feito para o público feminino.
A lição que fica aqui é: cada mulher é um ser humano distinto. Não nos coloque em uma bolha e tente nos vender algo universal.
4. Construa relacionamentos e entenda as dores do público feminino
Ser mulher não é nada fácil. E a última coisa que queremos é publicidade tentando nos vender receitas falsas e corpos inatingíveis.
A publicidade bem feita para mulheres, hoje, é aquela que entende o que realmente é ser mulher. É aquela marca que tem empatia pelas coisas e situações que passamos todos os dias.
Vamos aos exemplos:
#FightLikeAGirl, da Always
A campanha #FightLikeAGirl, da Always, tocou em um ponto muito sensível: a ideia de que fazer as coisas “como uma menina” é um insulto. A campanha viralizou e a marca ficou conhecida por trazer essa discussão à tona. As mulheres se viram na campanha. É um case incrível de bom storytelling e de se relacionar com as dores do seu público.
Blood, da Body Form
Quem diria que uma campanha sobre menstruação poderia ser tão emocionante? Ela mostra mulheres fortes, reais. Nada de mulheres dançando por aí, felizes da vida, enquanto passarinhos cantam no caminho.
#MyBeautyMySay, da Dove
A Dove já viralizou com diversas campanhas e ações para mostrar corpos e rostos diversos para divulgar seus produtos. O My Beauty My Say é apenas mais um exemplo disso.
O que apela para o público é a normalidade: as mulheres que vemos nas campanhas da Dove são mulheres que vemos no nosso dia-a-dia.
Poderiam ser nossas amigas e colegas de trabalho, não uma beleza perfeita e irrealista de Hollywood.
Por um 8 de março sem clichês, Netflix
Todo 8 de março é a mesma coisa. Mil campanhas brotando por aí com flores, rosas, chocolates, exaltando como as mulheres são incríveis, delicadas, fofas.
E não queremos nada disso! A Netflix mostrou muito bem como fazer uma campanha diferente no 8 de março e sabemos que sua marca também consegue fugir desse clichês, hein?
A publicidade está melhorando (mas ainda temos muito caminho a percorrer)
Viu como fazer marketing bem feito para mulheres não é tão difícil assim? Estamos melhorando, pouco a pouco, mas ainda temos muito a percorrer.
Cada publicidade machista veiculada é como um tiro em todas as mulheres que trabalham para esse mercado (e para as consumidoras também!).
Para terminar, um pouco de reflexão: como a publicidade seria se os papéis das mulheres nas propagandas fossem substituídos por homens? O Buzzfeed fez esse questionamento:
Somos e podemos fazer melhor. Podemos fazer um marketing interessante e que realmente converse com as mulheres, sem idealizações e insultos.